Dr. Lais Marques da Silva
Ex-Custódio e Presidente da JUNAAB
Através da estrutura da nossa Conferência, deveríamos manter em todos os níveis de responsabilidade um tradicional “Direito de Participação”, tomando cuidado para que a cada setor ou grupo de nossos servidores mundiais seja concedido um voto representativo em proporção correspondente à responsabilidade que cada um deve ter.
Para iniciar a exposição de um Conceito para Serviços Mundiais, no nosso caso, o Conceito IV, será necessário nos determos sobre o significado da palavra conceito. Aí é preciso que, pelo pensamento, possamos representar as características gerais daquilo que desejamos transmitir. Vemos então que estamos no mundo da abstração, das idéias. Teremos que definir, caracterizar por meio de palavras essas idéias e opiniões.
Estamos, portanto, no mundo da abstração, bem mais difícil de lidar. Enquanto que, no caso dos Passos e das Tradições, há idéias-síntese que dão clareza ao que se quer expor, como: “Os Passos são para o alcoólico viver e as Tradições são para a Irmandade viver” ou “os Passos ensinam a viver e as Tradições ensinam a conviver”, em relação aos Conceitos fica difícil condensar ou apresentar sínteses claras, como estas.
A idéia básica, existente no IV Conceito, é a da participação, entendida como ato ou efeito de participar, ou seja, de ter ou tomar parte, de associar-se pelo pensamento, pelo sentimento ou por meio de ação. A participação está relacionada às nossas necessidades espirituais e todos nós sentimos profundamente o desejo e a necessidade de tomar parte. Para isso, a Irmandade de Alcoólicos Anônimos foi idealizada como um grupamento humano, constituído por irmãos, irmanado. Temos como ideal comum, e mais importante, que a união espiritual dos membros de A.A. não permita o aparecimento de grupos de membros de primeira e de segunda classes e, para isso, entendemos que a ampla participação de todos os membros deva sempre ser assegurada.
O IV Conceito se constitui numa salvaguarda contra a autoridade absoluta, suprema. Isso porque, toda vez que se abre espaço para o aparecimento de uma autoridade absoluta, surge a tendência para um domínio excessivo, que se expande para todas as coisas, grandes e pequenas.
A experiência tem mostrado que nunca se pode colocar num grupo de pessoas toda a autoridade e em outro grupo toda a responsabilidade porque, sempre que isso ocorre, a harmonia verdadeira perde o espaço indispensável para existir e, sem ela, não há condições para viver uma vida feliz e pacífica. É aí que a participação se coloca como elemento essencial para a prevenção de situações de desgaste que contém no seu bojo o germe da desintegração, o agente que corrói a unidade. É preciso buscar sempre o equilíbrio entre autoridade e responsabilidade. Quem tem a responsabilidade por alguma coisa precisa de um grau de manobra que possibilite dar conta da responsabilidade que tem e esse poder de manobra precisa estar associado um grau de autoridade. Tudo na medida adequada, dentro da harmonia, fundamental ao bem-estar comum, à paz.
O princípio da participação faz com que nenhum grupo de membros seja colocado com autoridade absoluta sobre um outro, sendo que isso leva a uma forma incorporada de existir, entendida a palavra “incorporada” como um modo de fazer parte de um corpo. Acresce que, sendo esta característica acrescida do fato de não existir autoridade absoluta, o que resulta é uma forma horizontal de relacionamento e a inexistência de uma hierarquia, que é uma forma vertical de relacionamento comum nas instituições governamentais e, em especial, nas organizações militares.
Uma forma pela qual se manifesta o direito de participação é o direito de voto que todo membro de A.A. possui sendo que, no ato da votação, não há superiores nem inferiores.
O direito de participação é uma salvaguarda e é indispensável para evitar o mau uso e as asperezas causadas por uma autoridade suprema. Participar, por outro lado, implica em ajustar-se ao todo, ao corpo social e implica em aceitar uma saudável e necessária disciplina, pois que só assim teremos condições para nos tornarmos os “servidores de confiança” de que fala a Segunda Tradição de A.A., sem ter poderes para governar.
O ajustamento a um corpo social e a participação nas suas atividades tem uma importância fundamental para a recuperação do alcoólico e para uma significativa mudança no seu comportamento. Em primeiro lugar, o seu novo modo de ser o leva a uma forma de convivência inteiramente diferente da que tinha e que vai se tornando cada vez mais pacífica, em decorrência do crescimento espiritual que o convívio em A.A. proporciona. A participação no grupo social cria condições para uma troca de conhecimento e de experiências entre os membros de um grupo de A.A. que, por seu lado, leva a um acentuado enriquecimento de cada ser humano que, caracteristicamente, cresce espiritualmente no convívio com outros seres humanos.
É importante notar que, com o tempo, a participação evolui para uma condição mais rica e enriquecedora de relacionamento, que é a de cooperação. Aí já está presente a aceitação do outro, o reconhecimento da sua individualidade, do seu valor. Fica estabelecida uma forma de existir mais dinâmica e evoluída nos relacionamentos interpessoais que resulta em um ganho de dimensão humana significativo. Isso ocorre quando se passa para a cooperação porque o convívio entre seres humanos mostra que só coopera quem ama e só se ama quem coopera. Aí, amar o próximo, aceitar o outro como é e como irmão é de inestimável importância para o crescimento na dimensão humana, para o crescimento que todo membro de A.A. experimenta ao longo da sua convivência nos grupos.
De um ponto de partida aparentemente tão simples, de um singelo “Direito de Participação”, resulta um fato da maior importância para qualquer ser humano, que é crescer espiritualmente, ganhar dimensão humana, realizar-se dentro do seu projeto de vida, viver uma vida verdadeiramente humana e de continuo enriquecimento pessoal. Então, teremos todos a felicidade de desfrutar de uma serena sobriedade, de uma qualidade de vida que nos torna imensamente felizes em A.A. e é isso que vivenciamos intensamente em cada encontro de A.A. e por esta razão estamos hoje, aqui, vivendo as alegrias de um convívio de irmãos que se amam, que desfrutam de serena sobriedade.
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