Dr. Lais Marques da Silva
Custódio não alcoólico por 9 anos e Presidente da JUNAAB por 6
Foi bom você ter vindo. Volte sempre. Amanhã teremos uma nova reunião neste mesmo local e na mesma hora, venha outra vez. Você é bem-vindo e ficaremos contentes e felizes se você voltar. Simples como água mas, não obstante, profundo como um abismo. A mensagem que é passada é a de que, aqui, no grupo de A.A., você é desejado, você será sempre bem recebido. Você é um ser humano que tem valor, nós sabemos disso, e também que você é um doente e que é importante para nós, membros do grupo. Com o tempo, o recém-chegado vai perceber que, no grupo, não é visto como um renegado, como portador de um mau caráter e, mais tarde, vai entender que é apenas portador de uma doença.
Usualmente, quando vamos ficando adultos, no tempo da puberdade, começamos a sentir uma desconfortável sensação de angústia, que não é mais do que o desejo intenso de sermos, como seres humanos, desejados pelos outros. Precisamos mais do que ser aceitos, necessitamos ser respeitados, reconhecidos como tendo valor e, sobretudo, desejados pelos nossos semelhantes. Esta angústia se manifesta como uma sensação de medo, desconfortável e perturbadora, cuja causa é desconhecida. É uma sensação anormal e ameaçadora de apreensão ou medo às vezes marcada por sinais fisiológicos como sudorese, tensão e aceleração do pulso, causados pela dúvida ligada à realidade ou à natureza de uma ameaça, apenas sentida, e pela incerteza quanto à sua própria capacidade de lidar com o indefinido problema. A angústia nos acompanha pela vida afora e é a razão para a ingestão de quantidade enorme de medicamentos ansiolíticos por parte, sobretudo, dos que vivem no mundo civilizado. Mas o fato de ser amorosamente recebido pelos membros do grupo e convidado para retornar sempre faz o recém-chegado perceber que não é discriminado ou vítima de preconceito e ainda que, estando entre seres com essa dimensão humana, já se sente apoiado pela solidariedade, sentimento marcante e presente nos grupos de A.A. , e também desfrutando do alívio e do conforto que ela trás para o seu sentimento de angústia, de medo.
Agora, vamos considerar o anseio de ser desejado por parte de um alcoólico, quando na ativa. Em realidade, ninguém o deseja e, se alguém tiver em relação a ele algum desejo, é de que fique longe e não perturbe, que não traga problemas, que não seja incômodo, que não seja inconveniente, ou que vá dormir e curar o seu porre. É um modo de desejar às avessas, o que torna mais intenso o medo e a angústia do alcoólico na ativa. Por outro lado a inconsistência do comportamento de um alcoólico na ativa é tão grande que resulta em que não há importância no que diz e nem no que relata que pretende fazer e, muito menos, nas promessas que faz para o futuro ao expor os seus planos. Essa situação, por vezes, se prolonga por anos e anos ao longo do período de alcoolismo ativo, quando o curso da vida se torna errático e imprevisível. E não é difícil concluir que nele existe sempre uma forte sensação de frustração e de medo, além da certeza de que têm pouco valor e, por isso, não é desejado. Sente-se como moeda de pouco valor que, ao ser cunhada, não ganhou nem a efigie de César nem a de um anjo.
Feitas essas considerações, podemos imaginar o quão importantes são aquelas palavras que lhes são usualmente dirigidas quando, pela primeira vez, vão a um grupo de A.A. e elas eram tudo o que mais necessitavam. Era o melhor que poderiam ter ouvido. Era o “remédio” certo para um grande desconforto, era o alívio de há tanto desejado, era o bálsamo para a alma de que tanto careciam. Palavras sábias e exatamente, precisamente, as mais necessárias para lidar com o tão dramático sentimento de ser desprezado, de ser abandonado, de não poder contar com ninguém, de estar em uma condição de equilíbrio profundamente instável, de sentir que qualquer situação mais traumatizante poderia ser o fim do caminho ou representar o desequilíbrio definitivo da estrutura mental. É como se estivessem num mar de tempestade, sem direção e com a vida, a todo o momento, ameaçada por assustadoras ondas que não cessavam de surgir; é como estar vendo o fim de tudo e, nessa difícil e desesperada situação, receber a ajuda certa; é ver surgir o bote de salvamento que muda tudo, muda o presente e traz o horizonte de um futuro promissor. Aquelas palavras tão simples, simples como água, ouvidos quando, pela primeira vez, os alcoólicos chegam a um grupo de A.A., são profundas e salvadoras e ainda trazem consigo um imenso potencial de transformação. Eram exatamente essas, e não mais que essas, as palavras exatas e certas para a terrível angústia, para o medo sempre presente, para a exacerbada angústia causada pelo alcoolismo. Assim é o A.A..
Tudo em A.A. faz sentido. Há uma razão de ser para cada coisa, para cada procedimento, para cada palavra. Os textos, procedimentos e palavras são exatos, são o resultado de longa meditação e sedimentados por experiências vividas por todos os membros da Irmandade. É sabedoria acumulada por quase um século de existência, proveniente de vivências somadas por todos os membros da Irmandade, em todas as partes do mundo.
Junta de Serviços Gerais de Alcoólicos Anônimos do Brasil – JUNAAB
Rua Padre Antônio de Sá, 116 Tatuapé São Paulo – SP – CEP 03066-010
aa@aa.org.br
Segunda a Sexta – 08:00 às 17:30
+55 (11) 3229 – 3611